terça-feira, 23 de setembro de 2014

TRANSPORTE COLETIVO DE PORTO ALEGRE. QUEM PAGARÁ A CONTA???

No dia de ontem, tive três fortes razões para ocupar a tribuna.
A primeira delas é, por óbvio, saudar o meu colega, Cláudio Conceição, que vem fortalecer a nossa Bancada ainda que temporariamente, mas num prenúncio do que será, muito breve, de forma definitiva. O Conceição sabe muito bem do apreço que tenho por ele e da certeza de que, salvo coisas muito positivas que possam ocorrer na sua vida, entre as quais ser convocado para ir para a Assembleia Legislativa do Estado, o seu futuro é breve estar conosco aqui na Câmara Municipal.
De outro lado, Sr. Presidente, quero, dizer do meu júbilo, da minha satisfação com o êxito da programação da Semana Farroupilha em Porto Alegre, muito especialmente do acampamento nativista. Pessoalmente, tenho essa alegria redobrada na medida em que vejo que dela participou intensamente um jovem que já trabalhou nesta Casa, na minha assessoria, o Giovani Osório Tubino, que é um dedicado, é um trabalhador que tem muito a ver com o que está sendo decantado na Cidade como o melhor dos acampamentos nativistas ocorridos ao longo da história de suas realizações.
Finalmente, um assunto bem menos ameno, que não é de regozijo e em que, de certa forma, eu contrario a maioria desta Casa e, quiçá, a maioria da população da Cidade. Ontem estava sendo muito festejada a publicação do edital de licitação para o transporte coletivo na cidade de Porto Alegre.
Eu, particularmente, não participo desses festejos porque entendo que nós estamos perdendo, aqui no Município, uma grande oportunidade de enfrentar o problema na sua real situação, especialmente no seu grande fundamento e na grande etapa a ser transposta.
Eu não acredito que a licitação vai ser a panaceia que todos indicam, esperam ser, superando todas as dificuldades que o transporte coletivo vem apresentando na Cidade, como de resto apresenta em todo o Brasil.
Eu quero aproveitar o ensejo para dizer, com conhecimento de causa, que o transporte coletivo da cidade de Porto Alegre foi, até bem pouco tempo, o melhor do Brasil, e que hoje é um dos melhores, por situações que alteraram sua condição no momento presente.
Mas, de qualquer sorte, acho que o problema maior do transporte coletivo brasileiro, que se acentua aqui em Porto Alegre, é a forma de financiamento da sua realização.
Ocorre que, ao longo do tempo, a sociedade brasileira, através das suas representações, na maioria das vezes pela via legal adequada, introduziu, nos dispositivos legais e constitucionais que fazia, a política do chamado bem-estar, que muitos hoje estão dizendo que é a política do bonzinho, pela qual o Poder Público acumula determinados segmentos da sociedade com algumas vantagens, com alguns benefícios, muitos dos quais justificados, mas pagos de forma inadequada.
Hoje, mais acentuado do que na nossa época, a forma de financiamento do transporte coletivo em Porto Alegre está entregue exclusivamente ao usuário do transporte coletivo, que paga, em última instância, todos os benefícios que a bondade dos legisladores e do Prefeito possam, ao longo do tempo, ter oferecido. Hoje, sabidamente, aproximadamente 30% do custo da tarifa é decorrência dos benefícios que são concedidos. Benefícios que – repito – são justos, tipo a não cobrança de tarifa dos idosos, que, por legislação federal, é assegurada a todos aqueles que têm idade superior a 65 anos e, por legislação municipal, é concedida inclusive para aqueles outros que têm idade superior a 60 anos – único caso no Brasil.
Isso é correto? Isso é adequado?
Eu acho que é um benefício dado à maioria da população que contribuiu durante toda a sua vida, com seu esforço, com seu trabalho para chegar aonde chegaram - se justifica!
O que não se justifica é o legislador federal votar lei, conceder o benefício e esquecer de estabelecer quem é que vai pagar por esse benefício!
E o benefício, no fim, reverter nas costas do usuário do transporte coletivo que, normalmente, é pessoa de baixa renda e que, em muitos casos, está pagando a passagem daquele outro que tem uma renda maior do que a dele na sua aposentadoria.
Então o enfrentamento dessa questão, é o grande desafio que se tem hoje na sociedade brasileira. Em licitações, em discursos, em novas legislações, tudo isso contorna o problema. Ora, sabidamente, qualquer atividade econômica tem os seus custos, e esses, inclusive, por obrigação constitucional, devem ser cobertos ora pelo Poder Público, indiretamente, quando ele faz a exploração, ora com a devida indenização daqueles que têm essa atividade delegada pelo Poder Público concedente.
Em ambos os casos, isso não vem ocorrendo, quem paga a isenção da tarifa do funcionário da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, é o pobre, que não ganha o que ele ganha. Sabe quem paga a tarifa do seu colega policial isento, do brigadiano isento?
É o usuário!
Então esse sistema é injusto, e eu posso dizer mais, é cruel. Inclusive é tão cruel, que há bem pouco tempo pagava imposto, inclusive, para o Município.
O Município dava com uma mão e tirava com a outra. Hoje o transporte coletivo, a empresa gerida pelo próprio Município comprova toda essa minha afirmativa.
E o Município injeta, mês após mês, a titulo de aumento de capital na Companhia Carris valores que, segundo constam, superam R$ 2 bilhões por mês para financiar o custo da sua operação. Hoje o Município deixou, renunciou, através de lei municipal que nós aprovamos, nós, o Governo, até contrariando as vozes da oposição, a redução e a eliminação da cobrança do Imposto sobre Serviço de Qualquer Natureza que, em nível de 3%, era pago pelas empresas até o momento em que foi dada a absorção por parte desse fato. Isso ia para a tarifa, porque empresário nenhum paga imposto. Ele recolhe imposto do contribuinte, recolhe o imposto do consumidor e paga para o Governo.
No fim, a corda estoura do lado do mais fraco, e o mais fraco é, no caso concreto, o usuário de transporte coletivo, que asfixiadamente paga uma tarifa que ele julga que é cara e que eu digo que poderia ser bem mais barata, se houvesse uma forma mais inteligente de financiar a operação do sistema aqui em Porto Alegre, como já está ocorrendo em algumas cidades brasileiras. E isso não tem mistério!
A forma que está sendo encontrada em São Paulo, Curitiba, Rio de Janeiro para manter uma tarifa mais baixa é o subsídio.
Não há outra maneira de ser!
Na França, um subsídio complicado por vários sistemas, mas em Paris é subsidiado o transporte coletivo, em Madri, em Barcelona, em Lisboa, no mundo inteiro. Nós aqui teríamos que ter, na ausência de outra solução, que eu não diviso, e eu não sou nenhum visionário, a ausência de outra solução teríamos que fazer com o conjunto o que hoje é parcialmente feito com a Companhia Carris Porto-Alegrense.
Por isso, com toda a tranquilidade, no momento em que se festeja a licitação que é reaberta a partir de hoje, eu não me incluo entre aqueles que festejam porque entendo, que perdura o problema na sua raiz, na sua base.
Quem vai pagar o custo de tudo isso?
Que o povo merece ter um bom coletivo, não há dúvida alguma; que o povo tenha que suportar o seu uso, ainda que discutindo se admite, mas o povo não pode pagar pelo que usa e pelo que os outros usam também, porque aí é cruel, é injusto, é incorreto e deveria ter sido objeto de um estudo nesse período em que se pretende modificar estruturalmente o sistema de transporte coletivo na Cidade.
É por essa razão, não é por outra razão que vim à tribuna, no dia de ontem, dizer que não estou festejando a licitação aberta.
Não sou daqueles que estão a passar para a população que essa licitação, ao final e ao cabo, vai resultar nos benefícios que alguém imagina.
Aliás, grande parte dos que pediam a licitação são os mesmos que pediam a estatização do transporte coletivo na Cidade, mas como fazer uma licitação e ao mesmo tempo, promovermos a estatização? São impossíveis essas situações.
Nesse conjunto de incoerências sobressai, a meu juízo, essa circunstância toda especial.
Eu sei o custo do meu pronunciamento, sei que será dito que vim à tribuna para defender os empresários, sei que será dito que sou comprometido com aqueles que operam o transporte de Porto Alegre legitimamente porque detêm essa delegação há mais tempo.
Assumo o risco, e tenho a consciência de que o meu pronunciamento, tem base na seriedade do exame aprofundado de uma realidade de quem, inclusive, conheceu no passado o pavor que foi o transporte público estatizado na cidade de Porto Alegre, o caos que era o atendimento à população. Por conhecer tudo isso, eu acho que é do meu dever, eu que tenho quase 75 anos de idade, nessa hora em que tudo é expectativa de que algo de muito bom possa surgir, tudo é festejo, dizer, antes que aconteça, que eu não me incluo entre os que estão festejando.
Tenho sérias dúvidas, e em muitos casos, até certeza de que a coisa não terminará do jeito que alguns sonham que possa terminar, muito antes pelo contrário, maus momentos estou preconizando, maus momentos, com certeza, haverão de surgir, e tenho expectativa de que não sejam os piores possíveis, mas, com toda a razão, não haverão de ser os melhores.
Aqueles que irão realizar a utopia de alguns, de achar que em Porto Alegre é possível ter um transporte público bom, barato, e, se possível, de graça, saibam que alguém tem que pagar o custo de toda essa festa.

Que não seja o povo, que não seja o usuário, é este o meu desejo, que, lamentavelmente, na atual circunstância, e dentro da lógica predominante, não irá acontecer.  

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